12 de abril de 2010

Albano II


Palavras de Albano II


Caro mio,
Bom te ouvir, bom saber que retomas o diálogo com teu corpo, com teu habitat primevo. A natureza põe e repõe seguindo um movimento que nos é estranho, posto que estamos viciados a raciocinar baseados numa lógica que aprendemos em academias.
Nos olvidamos de escutar as mensagens emitidas pelos nossos corpos no contato íntimo com a vida. Nos olvidamos de escutar e de dialogar com o outro animal que nos habita desde que nascemos.
Os Xamãs falam sobre tais animais que existem em cada um de nós. Sendo que a partir deles, os Xamãs se comunicam com os demais animais que não da nossa espécie. Bukowski (me lembrou a Gabe) falava de um pássaro azul que o habitava, mas que ele o calava através da loucura, da embriaguês e da droga. Creio que ele, com o seu destino trágico, não conseguiria conviver com o pássaro azul que nele habitava.

Este animal que vive em nós, querido amigo, se exprime muitas vezes nas metáforas que criamos ou reproduzimos. Você, com sua águia, eu com meu elefante, e assim outros e tantos outros que se quisermos podemos nos lembrar, tratamos de vínculos com animais não humanos, pois eles estão em nossas raízes, nas sementes que são plantadas por esta mesma e única natureza que nos criou, que possibilitou nossa existência, seja Warat, seja Albano, seja quem for.

Mas sempre deixamos de lado este diálogo interior, intimista e único, que nos permite não só vivermos o momento único de nos vermos ao longo da trajetória existencial que produzimos, como também com o animal que nunca tentamos desvelar para nós mesmos e assim recepcioná-lo em nossa finita caminhada em Gaia, que nos faz existir.

Nos perdemos com o nosso excesso de “viver humanamente” conforme os preceitos civilizatórios que nos envolvem. Abandonamos a “reserva selvagem” (termo que usas belamente) que é nosso habitat primevo, e, às vezes, pensamos que ela se manifesta tão somente na presença de um outro que julgamos amoroso, apaixonado. Não, caro mio, entendo que este lugar é único em cada um de nós e não pela motivação do outro que despertaria tal “reserva”. Tal lugar é como se fora o éden de cada um de nós, onde nossos elementais se manifestam de modo que apenas nós poderemos reconhecê-lo.

Por não convivermos com a riqueza deste mundo interior, tentamos preencher nossa “solidão” com os adereços colocados a nossa disposição nos shoppings da vida. Assim como também com pessoas que pensamos egoistamente que poderiam preenchê-la (filhos, colegas, amantes, amigos), quando tão somente eles podem caminhar ao nosso lado, mas nunca fazerem ou complementarem aquilo ao qual nos destinamos.

O amor, nada mais é do que um gesto, generoso ou egoísta que temos em relação ao outro e que permite o convívio dos seres da nossa espécie. Os demais animais não utilizam tal subterfúgio, apenas convivem uns com os outros, em harmonia ou desarmonia, cumprindo papéis únicos de cada espécie, sem com isso negar as outras espécies dos habitats comuns a todos. A solidão requer o convívio, mas nunca a alienação no outro.

Caro mio, a natureza mais uma vez te põe frente a frente com tua “reserva selvagem”. Desta vez faça as incursões necessárias a ti mesmo, construa a cartografia singular, invente a gramática que te ponha em contato com o ser que te habita e que te define verdadeiramente, pois só ele, apenas ele, estará ao teu lado quando saires deste plano sublunar. Aprenda a conviver com você mesmo, porque da cultura e civilização humanos já sabes em excesso.
Ciao


Albano

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